Segredos da Fiscalização Parte 3: O Personalismo é uma das Portas Abertas à Corrupção!

A gente fica sempre se perguntando como a corrupção nasce na sociedade. Quais mecanismos permitem que determinados políticos desviem os recursos dos nossos impostos? Pois saiba que a arbitrariedade e o personalismo na Administração pública é uma das portas abertas à corrupção! Dando sequência à nossa série, quero agora conversar com você sobre o Princípio da Impessoalidade.

O Personalismo é uma das Portas Abertas à Corrupção Robson Cutrim Marketing Digital Eleitoral

Só para ilustrar, esse Princípio me fez lembrar uma dúvida real trazida recentemente por uma aluna da Academia de Vereadores. Na cidade dela, a filha de uma vereadora trabalha na secretaria de saúde. Ela é quem “dá as cartas” no encaminhamento para consultas médicas e cirurgias que precisam ser realizadas fora do município. A nossa aluna descobriu que pessoas indicadas pela vereadora estão passando na frente de outras há mais tempo na fila.

Inegavelmente, essa prática é uma afronta ao Princípio da Impessoalidade. Quem nunca presenciou isso na sua cidade? Veremos aqui como você pode identificar e denunciar esse mecanismo de corrupção.

Princípio da Impessoalidade: o que é?

O Princípio da Impessoalidade está previsto no Art. 37 da Constituição e tem dois significados. Em primeiro lugar, ele traz implicitamente o princípio da Finalidade. Ou seja, os agentes públicos não podem praticar atos que visem seus próprios interesses ou de terceiros, devendo cumprir a vontade da lei. Como resultado, se o agente público age visando satisfação de seus próprios desejos pessoais, o ato será nulo por desvio de finalidade.

Portanto, um dos objetivos de o Princípio da Impessoalidade ter sido colocado na Constituição é impedir subjetivismo e arbitrariedade na gestão da coisa pública. Assim, o Princípio é decorrência também da ideia de Isonomia (ou igualdade). Ele impede perseguições, favorecimentos e discriminações benéficas ou prejudiciais aos administrados.

Dessa forma, para resumir, o primeiro significado do Princípio da Finalidade está associado com os seguintes conceitos:

  • Imparcialidade
  • Finalidade é o interesse público
  • Igualdade de tratamento
  • Objetivismo

Ao mesmo tempo, o segundo significado do Princípio visa impedir que os políticos e os agentes públicos se promovam às custas das realizações da administração pública. Trata-se de uma vedação à pessoalização na condução dos negócios públicos. Esse significado é reforçado no primeiro parágrafo do Art. 37 da Constituição:

§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

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Respondendo à dúvida da nossa aluna

Voltemos ao caso da nossa aluna da Academia de Vereadores. Agora ficou mais fácil perceber que esse tipo de prática é ilegal? Para aqueles que vão até a vereadora e têm seu pedido atendido, pode parecer que ela faz um bem à sociedade. Mas e os cidadãos que não conseguiram esse privilégio, como ficam? Afinal, olhando do ponto de vista individual, ela resolveu o “meu problema”: deu um “jeitinho” para eu conseguir aquela consulta sem ter de esperar na fila.

Contudo, a vereadora e sua filha estão, dentre outras ilegalidades, infringindo duplamente o Princípio da Impessoalidade. Em primeiro lugar, elas estão se valendo de realizações da administração municipal para promoção pessoal. Essa conduta é comum nos municípios e tem ajudado a eleger muita gente da velha política.

Em segundo lugar, elas estão promovendo discriminações benéficas e tratamento não igualitário entre as pessoas da cidade. A secretaria de saúde até poderia favorecer alguém na fila de espera, mas desde que baseado em critérios técnicos e transparentes para toda a sociedade. Poderiam ser priorizados, por exemplo, aqueles pacientes com maior risco de morte.

Assim, gostaria que você refletisse atentamente ao que vou falar agora. Além dos prejuízos diretos, penso que o maior mal que esse tipo de conduta gera é minar a confiança mútua entre as pessoas de que as regras vão ser respeitadas por todos. Quando essa confiança é quebrada é cada um por si.

Quando as pessoas não confiam mais nas instituições para aplicar as regras e nos seus co-cidadãos para respeitá-las, é maior a probabilidade de que elas procurem favorecimentos através de agentes públicos ou políticos que elas conheçam. Além disso, esses favores raramente saem “de graça”. Está aberta aí uma porta para a corrupção e a compra de votos!

Academia de Vereadores Canal no Telegram com Anderson Alves

Como a nossa aluna deveria denunciar?

As pessoas que querem construir um novo jeito de fazer política não podem se calar diante de situações como essa. Portanto, se você identificar esse tipo de prática na sua cidade, recomendo que, primeiramente, busque elementos que comprovem os favorecimentos ilegais. Entreviste pessoas beneficiadas e prejudicadas. Por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), solicite acesso à lista de espera, bem como das pessoas que foram encaminhadas para consultas nos últimos 6 meses.

Use seu direito de acesso à informação para questionar a Administração das justificativas para determinadas pessoas terem sido priorizadas na lista. Quais são os critérios? Os procedimentos para alguém entrar na lista e ser atendido é divulgado para a população? Lembre-se, a corrupção opera no segredo!

De posse dessas informações, o próximo passo é decidir o que fazer com ela. Do ponto de vista institucional, como tratei no artigo anterior, você pode recorrer ao Ministério Público, Tribunal de Contas ou Câmara de Vereadores. Ademais, há ainda a possibilidade da ação popular proposta diretamente na justiça.

Mas o que tem se mostrado bastante efetivo e rápido é mobilização pelas redes sociais através de pressão popular. Ainda mais num contexto em que, por vezes, Ministério Público e Tribunais de Contas são cooptados pelo Poder Executivo e Legislativo e nada fazem com nossas denúncias.

Princípio da Impessoalidade na Prática: outros casos reais no Brasil

Outro caso clássico de desrespeito ao Princípio da Impessoalidade ocorre quando o governante resolve se promover através da publicidade oficial. Recentemente, o governo de Goiás entregou à Assembléia Legislativa do estado a sua proposta de reforma administrativa. Uma das coisas que chamou atenção foi que na página 99 do documento há uma imagem do atual governador, acompanhada de uma mensagem “inspiradora”.

Ademais, são vedadas propagandas de realizações do governo que utilizem slogan ou imagem de campanha do Presidente da República, governador ou prefeito. O então prefeito de São Paulo, João Dória, chegou a sofrer Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público por esse tipo de conduta. Acesse a Ação nesse link aqui. Ela é uma aula sobre a aplicação do Princípio e de como coletar elementos de comprovação e denúncia.

Resumindo as ideias: o personalismo é uma das portas abertas à corrupção

Além de prosperar no segredo, a corrupção também progride na arbitrariedade e no culto à pessoa do governante. O cara ganha a eleição e pensa que a prefeitura é sua por quatro anos. Daí se acha no direito de fazer o que bem entende, inclusive com os recursos da cidade. Enquanto a nossa sociedade permitir que esse tipo de governante se estabeleça no Brasil, os resultados serão os mesmos que vemos observando desde que nascemos.

O seu projeto político pode muito bem ser o pontapé inicial para as coisas mudarem na sua cidade. Participar das decisões, fiscalizar e cobrar resultados é o único caminho para quebrar esse ciclo. Não podemos deixar a coisa correr solta porque a arbitrariedade e o personalismo são uma das portas abertas à corrupção!


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11 Comentários


  1. Acompanhei e li os exemplos sobre o Principio da Impessoalidade. Reconhecemos que as coisas estão mudando. As pessoas estão mudando. Os políticos também precisam mudar, senão quem irá mudar de lugar são eles, porque o voto ainda é o instrumento mais poderoso na troca dos políticos da velha política. Sinto hoje uma situação confortável onde todos poderão disputar uma eleição de igual para igual. Ainda existem os vícios, mas, com o tempo tudo isso certamente mudará. E mudará para melhor. Entendo também que ainda não será a vez das redes sociais. Ela ajudará e muito mas, ainda é a vez da valoração do Ser Humano. Do voto corpo a corpo. O dinheiro sempre ajuda, mas, vencerá as eleições de 2020 quem tem história, luta e trabalho em suas comunidades. Com a ausência da coligação proporcional agora será a hora de medi forças e o campeão de voto será aquele que com simpatia conquistará seu eleitorado. 2020 é o ano da mudança.

    Responder

    1. Obrigado pela audiência Roque,

      Realmente as mudanças estão acontecendo e é preciso resiliência na construção de uma trajetória política.

      Continue acompanhando nossas dicas semanais!

      Já conhece nosso canal no youtube?

      Responder

    2. Olá Roque. Obrigado pelo comentário.

      Concordo com seu ponto de vista sobre o trabalho corpo-a-corpo. As redes sociais devem ser vistas mais como uma ferramenta para aumentar a audiência do seu trabalho do que um fim em si mesma.

      Sucesso no seus projetos.

      Responder

      1. Olá Anderson estou a poucos dias tendo contato com os seus conteúdos, porém posso afirmar que estou extremamente satifeito, existem várias informações arrespeito do assunto mas me identifiquei totalmente com os seus, pretendo ser candidato em 2020 e suas informações é pertinente, temos que combater mesmo a corrupção porque ela é o câncer do nosso país.

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  2. Adorei o tema estava discutindo sobre o abuso de funcionário cargo de confiança fazendo politica com o seu trabalho

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    1. Obrigado pela resposta Alexandre,

      Muitos funcionários, comissionados ou públicos, fazem esse tipo de ação – o que é condenado!

      Daí a importância de se conhecer as leis para poder fazer uma campanha eleitoral limpa

      Continue acompanhando nossas dicas semanais!

      Já conhece nosso canal no youtube?

      Responder

    2. Obrigado pelo seu comentário Alexandre!

      Os Princípios da Administração Pública servem justamente para para estabelecer os limites de atuação dos agentes com a coisa pública, uma vez que as leis não conseguem prever todas as condutas possíveis.

      Sucesso nos seus projetos.

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        1. Boa tarde Alex.
          Desculpe não ter respondido anteriormente. Infelizmente a notificação no meu e-mail com sua pergunta só chegou hoje a tarde pra mim.

          Informo que o nosso curso de Finanças Públicas Municipais: Mestres da Fiscalização já se iniciou em janeiro de 2020. Contudo, cabe salientar que o curso é um módulo dentro do curso Academia de Vereadores. Você já se matriculou?

          Uma vez aluno do curso, você já vai poder acessar as aulas que gravei com o Anderson e as próximas aulas também. Ainda tem muita coisa pra gente ver.

          Um abraço.

          Responder

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